Cuidados ajudam a preservar alimentos


Nelson Gonçalves


Quem já passou pelo dissabor de guardar um saquinho de pipoca ou de canjica e ao procurar, semanas depois na dispensa, encontrá-lo com caruncho e todo estragado, tem uma leve noção do que é o desperdício de alimentos. Com uma técnica simples, o uso de dentes de alho num vasilhame fechado, os membros da Igreja dos Santos dos Últimos Dias, os mormons, como são mais conhecidos estão ensinando milhares de pessoas a conservar alimentos para não estragar. Os números do desperdício de alimentos podem ser maiores se forem contabilizadas as perdas em restaurantes, hotéis, feirões, mercearias e supermercados. Somente na Companhia de Entrepostos e Armazéns do Estado de São Paulo (Ceagesp) de Rio Preto eram jogadas fora, até pouco tempo atrás, 5,8% das 7,3 mil toneladas de legumes, frutas e verduras que passam mensalmente por esse entreposto de distribuição.

O Brasil é um dos maiores produtores de alimentos do mundo, mas também é o campeão no desperdício. No ano passado o País bateu recorde na produção de grãos, com 123 milhões de toneladas. Só no campo agrícola, a falta de cuidados na colheita, uso de máquinas desreguladas, transporte inadequado e problemas de armazenamento causaram perdas de 20% da produção, segundo estudos do Ministério de Agricultura e Abastecimento. Os prejuízos nas roças de frutas e hortaliças são ainda piores. Estima-se que entre 30% a 40% da produção das frutas e verduras vão para o lixo. De acordo com a Abracea, associação fundada há 15 anos e que reúne as Centrais de Abastecimento (Ceasas) no Brasil, o desperdício na agricultura é equivalente a 1,4% do Produto Interno Brasileiro (PIB), que em valores monetários signficaria R$ 11 bilhões. O volume daria para fornecer cestas básicas mensais para alimentar 7 milhões de famílias durante um ano.

De acordo com Geovani Victor Oliveira, coordenador dos programas de ações sociais dos Santos dos Últimos Dias (SUD), o controle para evitar desperdícios pode começar dentro de casa com o armazenamento correto dos alimentos. “Vinte e três milhões de brasileiros passam fome. E todos os dias jogamos fora no país comida suficiente para nutrir 19 milhões de pessoas”. Com 11 unidades na região, a SUD ministra cursos de graça todos os meses para os interessados em aprender técnicas de conservação e armazenamentos de alimentos. “As técnicas são simples e o curso é rápido, ministrado em menos de duas horas”, informa Oliveira.

Alho e fogo
O armazenamento de feijão, arroz, milho, soja, grão de bico, girassol, outras espécies de grãos e até mesmo farinhas, macarrão, açúcar, fubá, trigo e outros cereais pode ser feito em diversas formas. Uma delas, talvez a mais simples, é utilização de garrafas vazias, de 2 litros, de refrigerantes e dentes de alho com casca. A monitora Cleuza Gonçalves Garrido ensina que se deve limpar bem o vasilhame, escolher e secar os grãos. Os grãos devem estar bem assentados. “A cada quatro dedos coloque dois dentes de alho com casca. Eles devem ter a casca inteira, sem rachadura para evitar cheiro.” Depois tampe e vede com fita adesiva. Os grãos ficarão conservados intactos por até dois anos. “O alho tem o poder de sugar todo o oxigênio do recipiente”, afirma Oliveira. Utilizado no Egito, há quase 4.500 anos, durante a construção das pirâmides o alho tem, para muitas seitas, um poder miraculoso. Os egpícios eram conhecedores dos benefícios da alícina - substância presente nessa planta - para combater infecções e atuar na morte de bactérias.

Vácuo
Outra forma de conservar os grãos é pelo sistema à vácuo, onde a duração de conservação pode chegar a cinco anos. “Num vasilhame de vidro ou de lata assente bem os grãos, até faltar três dedos para enchê-lo totalmente”, informa Cleuza. A seguir, ela pede para que se faça uma conchinha com um pedaço de papel alumínio e coloque no centro dela um chumacinho de algodão embebido em um pouco de álcool. “Ateia-se fogo ao algodão e tampa-se imediatamente o recipiente. O fogo consumirá todo o oxigênio no interior do vasilhame, impedindo assim o desenvolvimento de qualquer tipo de vida aeróbica.” Para vedar, Cleuza aconselha a fita adesiva ou parafina derretida em volta da tampa.

Sobras matam a fome de 1,5 mil
Desde maio, quando foi criado do Banco de Alimentos em Rio Preto, mais de 20 mil refeições foram preparadas com as sobras das verduras, legumes e frutas da unidade local da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais do Estado de São Paulo (Ceagesp). Somente em novembro 43,7 toneladas de alimentos que iriam para o lixo serviram para saciar a fome de 1.500 pessoas de 40 instituições atendidas pelo Banco de Alimentação. Cento e cinqüenta voluntários ajudam na coleta e separação dos alimentos aproveitáveis para consumo. De maio a novembro foram aproveitados 203 toneladas de alimentos da Ceagesp. “Com as frutas estamos preparando geléias e polpas em conservas”, informa o professor Gavino Ufay, coordenador do projeto.

Campanha
Em Catanduva , os 340 funcionários da Cocam, indústria de café solúvel, fizeram parte de uma campanha que no ano passado doou 7,4 toneladas de alimentos para entidades beneficentes. A campanha coordenada pela Nutrin, empresa que terceiriza 47 restaurantes de indústrias espalhadas pelo interior paulista, consistia na troca de um vale-alimento para o funcionário que entregasse a bandeja do almoço vazia. O vale era depositado numa urna e no final do mês revertido em alimentos para as entidades filantrópicas.

Redução de sobras
“Com a campanha conseguimos conscientizar os funcionários para evitar desperdícios”, informa a nutricionista Patrícia Caspaninori. “Antes a média da sobra nas bandejas era de 6 gramas por pessoa. A sobra de um mês numa indústria de 340 funcionários era suficiente para alimentar mais 100 pessoas.” Os números foram comemorados pelo padre Osvaldo de Oliveira Rosa, coordenador de uma entidade que presta assistência para 180 famílias carentes em Catanduva. Sua entidade foi uma das beneficiadas com a campanha da Nutrin. Neste ano ele também passou a recolher toda segunda-feira os restos de legumes, verduras e frutas de uma rede de supermercado. “O que antes era usado para tratar porcos estamos alimentando famílias”, afirma o padre, sugerindo que outros supermercados aderissem ao programa de doação de alimentos perecíveis.

Placas com aviso
O comerciante Valter Sanches Feliciano, dono de uma rede de três restaurantes em Rio Preto que servem 1.200 refeições diárias, mandou fixar placas com avisos em todos seus estabelecimentos para informar que será cobrado R$ 1,50 para cada 100 gramas de sobra de comida no prato. “Depois desse aviso a sobra praticamente zerou”, afirma. “Antes tínhamos que jogar fora três sacos de 100 litros com restos de comida todos os dias.”


Saiba aproveitar tudo
O aproveitamento integral de alimentos é outra forma de evitar desperdícios. Da casca à semente tudo pode ser aproveitado. No Serviço Social da Indústria (Sesi) de Rio Preto passaram 2.700 pessoas em 2004 no curso ministrado pela nutricionista Silvia Valiani Marques, que ensina e incentiva à mudança de hábitos alimentares para a população, com o aproveitamento integral dos alimentos. "O brasileiro não tem idéia do que pode ser aproveitado", diz Silvia, exibindo um livro com 300 receitas econômicas e nutritivas. Em suas receitas tudo é aproveitado. Desde a casca da melancia ou do melão, por exemplo, para fazer uma deliciosa salada com sabor agridoce.

Dignidade
“Utilizar o alimento em sua totalidade significa mais do que economia. Significa usar os recursos disponíveis sem desperdício, reciclar, respeitar a natureza e alimentar-se bem, com prazer e dignidade.”

Delícias nutritivas
Em sua oitava edição o livro de receitas do Sesi, divulgado pela nutricionista em seus cursos, demonstra que é possível preparar pratos deliciosos e nutritivos com pouco gasto. Uma das dicas do curso é sobre o congelamento dos alimentos. Os alimentos congelados conseguem manter o sabor, a cor, o aroma e a consistência do produto fresco. “Além disso, os congelados representam uma verdadeira economia de tempo e dinheiro, pois a dona-de-casa pode diminuir as idas às feiras, planejar os dias que vai dedicar à cozinhas e fazer estoques dos produtos da época, que são sempre mais baratos e de melhor qualidade.”

Quanto mais rápido o alimento for congelado, e quanto mais devagar ele for descongelado, melhor será o resultado final. A nutricionista afirma que existe uma infinidade de pratos que podem ser feitos com aproveitamento integral dos alimentos. Entre eles estão croquetes com talos de verduras, ensopado com casca de mamão, bolinhos com casca de abóbora ou saladas com aproveitamento da casca do melão e da melancia. Sem falar no aproveitamento das folhas de beterraba e da cenoura no preparo de sopas, cremes e risotos. Os cursos são ministrados durante o ano todo no Sesi. Além de gratuitos, os participantes ganham um livro de receita e ainda podem se deliciar com os pratos preparados na hora.

Serviço: - Curso Alimente-se Bem com R$ 1. Local: Sesi de Rio Preto. Telefone (17) 224-6611. Curso de Armazenamento de Alimentos. Local: Igrejas dos Santos dos Últimos Dias (SUD). Telefone (17) 3011-0364.

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